Por que o Marco Temporal Importa?



A tese do marco temporal tem gerado intensos debates e mobilizações em torno dos direitos dos povos indígenas no Brasil. Essa tese jurídica propõe que os indígenas só teriam direito às terras que estivessem ocupando fisicamente em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. Mas será que essa abordagem respeita a verdadeira relação dos povos indígenas com suas terras ancestrais?

O que é o marco temporal?

A tese do marco temporal começou a ser aplicada em 2009, durante o julgamento da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Desde então, ela passou a ser usada para contestar os direitos dos povos indígenas às terras tradicionalmente ocupadas, desconsiderando os muitos fatores que levaram essas comunidades a serem expulsas de seus territórios, como violência, exploração e políticas de integração forçada.

Por que o marco temporal é problemático?

A Constituição de 1988 garantiu aos povos indígenas o direito originário às suas terras, um direito que precede até mesmo a formação do Estado brasileiro. No entanto, a tese do marco temporal impõe uma interpretação limitada, ao condicionar esse direito à ocupação física da terra em 1988. Isso ignora:

- Histórico de esbulho e violência: muitas comunidades indígenas foram forçadas a deixar seus territórios devido a invasões, esbulhos e ameaças, e, portanto, não estavam em suas terras em 1988.

- Tradição e cultura: o conceito de terra tradicionalmente ocupada vai além da ocupação física; é uma relação profunda de pertencimento, espiritualidade e cuidado que os povos indígenas têm com a terra.

- Direito originário: o direito às terras é anterior à Constituição de 1988 e não deveria depender de critérios temporais.

A decisão do STF em 2023 e o PL 2.903/2023

Em setembro de 2023, o STF decidiu que o marco temporal não é válido para a demarcação de terras indígenas, uma vitória histórica que reforça a constitucionalidade do direito originário. No entanto, o Congresso aprovou o Projeto de Lei (PL) 2.903/2023, que propõe a formalização do marco temporal para futuras demarcações. Esse projeto, que ainda aguarda sanção presidencial, ameaça a segurança dos direitos indígenas.

A consulta prévia e a Convenção 169 da OIT

A Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário, determina que as comunidades indígenas sejam consultadas previamente sobre qualquer decisão que impacte suas vidas e territórios. Aplicar o marco temporal sem consultar esses povos viola esse princípio fundamental e compromete o respeito à sua autonomia e autodeterminação.

Qual o futuro dos direitos indígenas?

A luta contra o marco temporal não é apenas uma batalha jurídica, mas uma questão de justiça histórica. Ela representa a defesa de uma visão de mundo em que os povos indígenas podem manter seu modo de vida, contribuindo com práticas sustentáveis que beneficiam toda a sociedade. Rejeitar o marco temporal é garantir que os direitos indígenas não sejam limitados por imposições externas, mas sim reconhecidos em sua plenitude e dignidade.

Como você pode contribuir?

Apoiar os direitos dos povos indígenas é fundamental para a proteção das culturas tradicionais e da biodiversidade. Ao lado das comunidades indígenas, é possível fortalecer o direito à consulta e à participação nas decisões que envolvem seus territórios, construindo um Brasil mais justo e inclusivo para todos.

O marco temporal não deve prevalecer. Respeitar os direitos indígenas é reconhecer a contribuição histórica dessas comunidades para a preservação ambiental e a diversidade cultural. Aqui no blog Saberes Vivos, continuaremos a acompanhar e divulgar informações sobre essa e outras pautas que afetam os povos e comunidades tradicionais, reforçando nosso compromisso com a justiça e a conservação ambiental.





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